terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

São Sebastião de Rampa

A conversa começou logo cedo, ainda pelo café da manhã. A Empregada queria uma folga extra de um fim de semana prolongado para participar dos festejos de São Sebastião de Rampa.
- Mas que santo é esse Ana, que eu nunca ouvi falar?
- Nunca ouviu falar de São Sebastião?
- Desse já. Mas de São Sebastião de Rampa? Este não! Isso está me "cheirando" a mutretagem.
- Não patrão. É o santo padroeiro de Rampa. Todos os "rampenses" se encontram para os festejos, que nem lá em Belém, no Círio de Nazaré. A única diferença é que em Rampa não tem corda, mas a quantidade de gente é quase a mesma.
- Ana, eu não sabia que a tua família era tão grande. Mas vamos deixar esta conversa para a hora do almoço.

Eu acho que sou masoquista. Como levar uma conversa desta logo para a sagrada hora da refeição, que deveria ser feita em paz e sem chances de rebelião. Quando percebi o meu erro jé era tarde, nem adiantaria eu tentar adiar. Pela primeira vez o almoço ficou pronto as 11 horas e ela nem perguntou se podia "botar na mesa". Já foi botando e chamando para almoçar. Diante destes fatos, previ que o assunto era muito mais crítico do que imaginava.


- Pronto patrão, do jeitinho que o senhor gosta. Arroz fresquinho e quente, um ovo frito com gema mole, feito na manteiga Real, e uma carne assada com molho especial e a farinha de Belém que eu guardei para não acabar logo.

- Pensei comigo: "quem está frito sou eu, não é o ovo". E aí veio o devaneio. Imaginei a Empregada com um frango, uma lata de farofa, uma passagem de ônibus para Rampa e um final de semana prolongado. Pronto, todos os ingredientes para fazer ela feliz.

Mas aí eu fui sádico: sabendo que estava encurralado e não teria saída, comecei a extravasar os devaneios em voz alta.

- Está bem Ana, fica liberada a sexta, o sábado e a próxima segunda.
Pelo visto vão todos os habitantes da invasão e mais a turma da Vila Lobão. Por isso a enorme quantidade de galinha que desapareceu nesta última semana. Já é até noticiário na televisão. Pelo que eles relataram, nem galo está mais cantando por lá. Todos eles foram considerados galos-gay e entraram na faca como se fosse uma boa franguinha.

Continuei meus devaneios em voz alta.

- Tenho pena do pessoal da rodoviária depois que vocês passarem por lá. Vai ser uma algazarra danada. É a meninada correndo de um lado pro outro, querendo caldo de cana uns com pastel outros com pão doce, daqueles de cobertura bem amarela, outros ainda atacando o coitado do frango assado com farofa. Aí, tem menino que cai e espalha frango e farofa pra tudo quanto é lado, sem contar as redes que são levadas em saco plástico de super-mercado, que arrebenta cai e se mistura com a comida que foi derramada, naquele alvoroço. Meu Deussss!!!! Saiam de perto.

- Penso nas mães gritando "Minino para com isso"; "Te aquieta Mundico"; "Mariazinha não bole com o Jãozinho"; "Ribiiinha, te acomoda seu peste, larga essa coxa que caiu no chão e não limpa a mão suja de farofa na minha saia". É, vai ser uma festa. Rampa que se prepare.

Vou conversar com o prefeito de São Luís. Para se ver livre desses pestinhas por um fim de semana inteiro, acho que vale a pena a prefeitura daqui patrocinar vários padroeiros no interior. A cidade fica mais calma e agradável.

E eu, continuo pensando. Já que a Empregada levou, na marra, um fim semana prolongado, nada mais justo que eu vá fazer as refeições em um bom retaurante e desconte do salário dela. Afinal ela se preocupou muito com o frango assado com farofa, para ela, e não pensou em nenhuma bandinha para mim, que eu também tenho fome.

Esses pensamentos malígnos me agradam muito. Como agradam.

Um comentário:

Anônimo disse...

Ainda bem que são apenas devaneios, com certeza Ana, agora romeira, não vai pedir ao santo para lhe proporcionar um outro emprego; com a afinidade que emboliu esse quarteto, será muito difícil refazer com outra pessoa.

Estampado algum exagero, mas pensar não paga imposto, e pode mudar a linha de pensamento ao bel prazer; mas no fundo, bem la no fundo, tenho quase a coragem de dizer que o "patrão" esta com uma pontinha de inveja; uma viagem, curta por assim dizer, saboreando "una pierna de pollo" com farofa, e tudo o que ele queria.